AULA 02
– DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO: novos olhares
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Objetivos
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Geral:
➢
Reconhecer as formulações
psicológicas do desenvolvimento cognitivo.
Específicos:
➢
Comparar os novos enfoques
psicológicos do desenvolvimento cognitivo, comparando-os entre si.
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ATENÇÃO
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.A psicologia contemporânea tem novos
olhares para os sujeitos (REGO, 2009,
p. 5).
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Assuntos
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➢
Características do desenvolvimento
cognitivo do aprendiz no contexto das diversas ciências.
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Introdução
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Olá, Estudante!
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Os êxitos e os fracassos
presentes em nossas escolas são sempre
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objetos de explicações. O
que varia são as explicações dadas que se
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focam nas diferenças entre
os estudantes.
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Um grupo de professores,
gestores e especialistas atribuem a razão
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dessas diferenças a
fatores endógenos e ambientalistas, isto é,
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independentes, por
conseguinte, da cultura, dos conhecimentos e das
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experiências educativas,
das vivências dos estudantes ou da própria
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subjetividade do aprendiz.
Que argumentos irrigam essas posições?
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Vejamos, então,
recapitulando nossa aula anterior.
Nos primórdios da psicologia, as teses inatistas ou
nativistas, de acordo com as premissas da filosofia racionalista, idealista e
apriorística – já estudadas na Aula 1 – postulavam, em resumo, que as
capacidades intelectuais de cada ser humano já estariam praticamente prontas
no momento do nascimento ou potencialmente definidas, só na dependência do
amadurecimento para se manifestarem.
A teoria nativista de percepção, a escola
gestaltista, as teses eugenistas e psicométrica, expressas nos trabalhos de
um número expressivo de autores (entre eles, J. Muller, E.Herring, J. Von
Uexkull,
H.R. Marurama, Mc Dougall, F. Galton, J. M. Cattel, A.
Binet, Burt, Jensen e h. Eysenck), são exemplos dessa abordagem (Ver
SALVADOR, C.C. e colaboradores, p. 215).
Por seu turno, a tese ambientalista ou behaviorista –
também, já estudada na Aula 1 – inspirada na epistemologia empirista e
positivista, deu relevo exclusivamente à ação modeladora do meio. Nesta linha
de concepção, se destacaram os estudos feitos por Helmholtz, Thondike,
Pavlov, Sechenov, Bekterev, Watson e Skinner que ajudaram a fortalecer dessas
teses até a metade do século passado (Ver SALVADOR, C.C. e colaboradores, p.
215).
.
Todavia,
a partir da década de sessenta do século passado, muitas pesquisas foram
sendo desenvolvidas nas ciências humanas e, boa parte delas na área da
psicologia da educação, refutando os argumentos citados acima e abrindo um
leque de possibilidades na
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compreensão desse fenômeno humano e epistemológico, na
medida em que demonstram de forma clara os limites dessas crenças, calcada na
dicotomia clássica indivíduo versus sociedade
(REGO, 2009).
Um traço dessa nova tendência investigativa em psicologia é
aquele que considera a natureza histórica do desenvolvimento e da
constituição da subjetividade dos aprendizes em busca do conhecimento. O foco
dessa abordagem são os processos de desenvolvimento e de configuração de
singularidades compreendidos como constituídos a partir da articulação de uma
grande complexidade de elementos, os quais envolvem fatores e significações
ligados aos componentes pessoais, interações e contextos sócio-históricos e culturais.
“O desenvolvimento é entendido como um processo ativo, de
apropriação pelo sujeito da experiência histórico-cultural. O sujeito é visto
como alguém que transforma e é transformado nas relações produzidas em cada
cultura. Assim sendo, nesta visão o aspecto biológico e o social não estão
dissociados, predominando um sobre o outro já que ambos exercem influencia
sobre o aprendiz (REGO, 2009, p.7)”.
Considerando essas premissas surgem no seio da
investigação científica, estudos denominados interacionismo ou
sociointeracionismo sob o manto das descobertas de três cognitivistas
pioneiros: Jean Piaget (1896-1980), L.S. Vygotski (1896- 1934) e Henry Wallon
(1979-1962), já citado anteriormente.
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Piaget Vygotski Wallon
Todavia, os psicólogos mencionados que já não vivem
em pessoa entre nós, estão presentes em nossa formação acadêmica e nas obras
de seus sucessores e pensadores contemporâneos de forma expressiva por terem
produzido avanços a partir dos legados recebidos.
Apesar das contribuições desses autores, a escola, vez por
outra, se desvia de seus ensinamentos, criando rotas escolares, como algumas
medidas avaliativas que redundam em preconceitos e discriminações, por
exemplo, a insistência de classificar, por exemplo, as crianças em fracas e
fortes.
A esse respeito, Nunes (2004, p.106) esclarece: “Esse
princípio (inexistência de critérios ou afrouxamento de critérios de
avaliação nas escolas populares – porque não se observa o mesmo fenômeno nas
escolas destinadas às camadas economicamente privilegiadas) pressupõe uma
imaginária incapacidade das classes populares para o aprendizado, o que, além
de não corresponder a nenhuma teoria científica de aprendizagem, legitima o
processo histórico de dualidade escolar e de desigualdade social”. E conclui:
“Será pelo direito à educação de qualidade e a uma avaliação pautada em
princípios pedagógicos, e não em relação de poder, que as camadas populares
superarão a barreira do fracasso escolar”.
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SABER MAIS (1896-1980)
Jean Piaget soube tirar ensinamentos das idéias de Binet, Wallon, Janet e Clarerède. Foi também
influenciado por alguns filósofos neokantianos, como Brunschwig e Meyerson e por alguns
epistemologista da
matemática. Esse cenário dá à sua obra uma originalidade
que contrasta com as correntes
empiristas e behavioristas dominantes na América do Norte.
|
“No ensino secundário, mais do que no primário, é
justamente a matemática o que
coloca o aluno em cheque”. [...] “Se o aluno não tem capacidade de
compreender as quatro operações, por exemplo, ele não é considerado
inteligente”. [...] No entanto, afirma Vergnaud (2003, p 18.), [...] “Quando
se fala de adição e subtração, não é verdade que estejam tratando apenas de
compreensão elementar complicada, como a questão dos números negativos. Não
se trata de uma operação numérica apenas, mas de questões morais. Portanto,
os números estão na base da construção de
valores”.
Os psicólogos pensadores que apresentaremos aqui, logo a
seguir, expressam em seus trabalhos a tensão ainda atual em compreender a
relação existente entre ação humana e os contextos históricos, sociais e
culturais em que essas ações ocorrem.
Você vai poder observar que eles, embora, tenham
projetos de pesquisas diferentes, todos convergem para os temas da subjetividade e da cognição como processos
socioculturais. Por conseguinte, a cultura e a educação têm para esses
pensadores um papel relevante na formação dos processos psicológicos. Assim,
todos estão atentos a educação e preocupados com o fator escolaridade como
uma parte importante nesse processo de construção do conhecimento.
Nesta aula serão exploradas as idéias de Gerard Vergnaud e
Jerome Bruner, que juntos representam uma nova filiação da psicologia,
avançando nas idéias de Piaget (1896-1980), Vygotski (1896-1934) e
Wallon. Os psicólogos
americanos Michael Cole
(1938) e James
Wertsch (1940),
dessa mesma linhagem, serão apenas citados
na
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Fonte: PLAISANCE, É.;
VERGNAUD, G.
As ciências da Educação.
São Paulo: Loyola, 2003, p. 65.
INFORME-SE MAIS (1896-1934)
Lev Vygotski é um
psicólogo russo bastante conhecido na União Soviética onde influenciou
pesquisadores como Luria e Leontiev.
Morre cedo, aos 37 anos,
deixando uma obra em grande parte inédita. Vygotsky formulou críticas aos
primeiros trabalhos de Piaget nos quais insistiu pouco como as funções da
linguagem e do adulto na transmissão dos conhecimentos e no desenvolvimento
cognitivo da criança.
Porem, as obras de Piaget e Vygotski são
convergentes e complementares
|
coluna à direita.
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VERGNAUD BRUNER
Nessa direção, essa aula está organizada em quatro tópicos.
No primeiro, você ter uma visão de algumas premissas que marcaram a ciência
psicológica defendida por Vergnaud acerca do desenvolvimento cognitivo e
Piaget. No segundo, momento, trataremos dos estudos de Bruner sobre o
desenvolvimento como um processo socialmente mediado.
Boa sorte!
I – As
contribuições de VERGNAUD sobre o desenvolvimento cognitivo a partir de
Piaget.
Uma questão fundamental é posta pelo autor da Teoria
dos Campos Conceituais:
O que é que se desenvolve
e sob que condições cognitivas e socais?
Para
Verganud (2003a, p. 22), se tivermos uma perspectiva teórica acerca de organização da atividade, o que se
desenvolve são as formas de nossa
organização da atividade,
isto é, a
ação de
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.
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(VERGNAUD, 2003,
p. 69).
Fonte: PLAISANCE, É.;
VERGNAUD, G.
As ciências da Educação.
São Paulo: Loyola, 2003, p. 65.
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WERTSCH mostra como as narrativas, como instrumentos culturais,
sustentam a memória coletiva (BUSTAMANTE, A.L.; MONTIMER, E. F. IN:
Revista Educação: autores e
tendências – Pedagogia
Contemporânea, 2.
Cultura, aprendizagem e Desenvolvimento.
2009,
p. 57)
|
conhecimento, e não estruturas
gerais de pensamento como formulou Piaget (1976).
Daí Vergnaud (1990, p. 135) dizer que a teoria de campos
conceituais é [...] uma teoria cognitivista que visa fornecer um quadro
coerente e alguns princípios de base para o estudo do desenvolvimento e da
aprendizagem de competências complexas, especialmente aquelas que decorrem
das ciências e técnicas
Para esclarecer a formulação anterior, explicitamos, a
seguir, o sentido dado por Vergnaud ao termo competência, também já
mencionado na Aula 1 (1994, p. 178).
A competência é entendida como a capacidade de que o
sujeito dispõe para enfrentar e resolver um determinado problema. A maior
parte de nossos conhecimentos são competências. Uma parte dessas
competências, somente, é explicitável, isto é, conseguimos conhecê- la.
Mas, é preciso uma teoria psicológica e didática
direcionada a essa questão para que isso seja mais bem revelado e
compreendido. Vergnaud propõe a Teoria dos Campos Conceituais.
Para Verganud (1990), é preciso conceber o processo
cognitivo não só como aquele que organiza as atividades e o seu funcionamento
em situação – (a conduta, a percepção,
a representação e as competências) -, mas também o desenvolvimento das formas
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M. COLE
Pesquisador cujas postulações teóricas referem-se, em grande medida,
à questão das diferenças culturais no
funcionamento cognitivo.
SAIBA MAIS
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inteligentes
de organização da atividade de uma pessoa durante a
sua experiência.
Uma pessoa é competente, portanto, se estiver em condições
ou habilitada a enfrentar determinada classe de situações ou classes de
situações. Por isso, Vergnaud (1990, p. 56) afirma:
“A teoria dos campos conceituais que eu desenvolvi
quer ser uma resposta a essa questão da referência: de fato,
fundamentalmente, o que funciona, o que se desenvolve é a conceptualização do
real, quer ela seja somente implícita na ação (não vista, não revelada) ou
quer ela seja explícita”.
Como vimos, com a teoria dos campos conceituais, Vergnaud
(1990) pretende oferecer um referencial ao estudo do desenvolvimento e da
aprendizagem de competências, levando em conta os próprios conteúdos do
conhecimento, quaisquer que sejam eles (Matemática, Português, História,
etc.)
Quando observamos os adultos como também as crianças, é
possível constatar que o desenvolvimento abrange vários tipos de atividades
como os exemplos a seguir:
·
O gesto do atleta de alto nível numa corrida
representada na figura a seguir:
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O francês
Gérard Verganud, 78 anos, foi diretor do Centro Nacional de Pesquisa
Cientifica de Paris, fala orgulhosamente de sua oriegem: tive “um pai
analfabeto e uma mãe que se aposentou como
empregada domética”. Filho de uma família de três filhos, foi escolhido para
receber uma bosade estudos. O encontro com Piaget, com quem estudo em Paris e
Genebra deu-lhe uma direção em sua vida, caminhando pela psicologia,
filosofia, pela matemática e didatica da
matemática. A toeria dos campos conceituais foi sua grande contribuição à Psicologia Cogntiva e à Didática da
Matemática.
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Fonte:
atleta-thumb 200980.ipg
·
O gesto dos artesãos expressos
numa obra de arte como vemos
abaixo:
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Fonte: overmundo.com.br
·
As competências científicas e
técnicas como podem vistas na ilustração a seguir:
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Fonte:overmundo.com.br
|
Na observação de crianças e de adultos, Vergnaud (2003a)
constata que o desenvolvimento abrange vários tipos de esquemas e os esquemas,
abrangem competências sensório-motoras complexas, como a habilidade de um piloto de fórmula 1 que é capaz de
abordar uma curva em alta velocidade, destaca Da Rocha Falcao (2003, p.
37).
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Carro de corrida
Essa competência agrega também competências
matemáticas como à contagem e a resolução de equações algébricas, passando
por competências socioculturais, como a habilidade do jangadeiro nordestino
em conduzir sua jangada a vela (DA ROCHA FALCAO, 2003, p. 37).
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.
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Jangada à vela
sendo conduzida ao mar
Inclui também esquemas
fonográficos que permitem associar pronúncias às formas escritas,
reconhecimento e compreensão das palavras e dos morfemas, enunciados e textos
(VERGNAUD, 2003, p.36).
No que se refere à compreensão de textos, percebe-se
que há aspectos sintáticos, lexicais, de compreensão e de organização de
texto que dizem respeito a competências distintas, complementares, mas que
devem ser consideradas em suas especialidades. Vejamos um exemplo:
Goigoux & Vergnaud (2005)
descrevem, os esquemas profissionais,
adotados por professores no âmbito da didática, de ajuda à criança na
localização de fonemas. Os autores observaram uma atividade de uma professora
experiente durante uma seqüência de ensino de correspondência grafema –
fonema, realizada no primeiro trimestre de CP (alfabetização), na França. No
início da seqüência, a professora traça no quadro-negro segmentos em linha
reta para representar palavras orais incluindo o fonema [u]. Um aluno,
chamado ao quadro, não consegue localizar esse fonema na palavra [ãRule]
(enroulé). A professora pede ao aluno para repetir devagar
|
enroulé, depois de segmentá-la em sílabas. Ela desenha três arcos de ciclos
horizontais no segmento representando a palavra, repete essa palavra,
acentuando a segmentação silábica e prolongando os três sons vocálicos. A
seguir, estimula o aluno a identificar os arcos
sucessivos, ordenados da esquerda para a direita, à medida que ela pronuncia
as sílabas. Depois, ela interroga: Em
qual sílaba se escuta o som [u]?; quando se diz [ã]?, [Ru]? [le]? O aluno
responde: Quando se diz [Ru]. Ela
valida a resposta do aluno e lhe pergunta em qual posição se encontra essa
sílaba [Ru]. É a segunda, responde
ele. A professora centra, então, a atenção do aluno na segunda sílaba,
repete-a e pergunta se ele escutou o som [u] no início ou no fim dessa
sílaba. O aluno repete a sílaba, acentuando o fonema [u], e declara: no fim. A professora valida a resposta
e pede para o aluno representar graficamente a solução traçando um ponto na
parte direita do segundo arco.
Em resumo, a professora fraciona a tarefa em duas
subtarefas e orienta a atividade do aluno. Ela o conduz, de início, a repetir
a sílaba que contém o fonema; em seguida, a localizar esse último na sílaba,
fazendo-o operar uma distinção entre ataque e rima. A eficácia de sua ajuda
reside na decomposição das operações implicadas na efetivação da tarefa, ao
mesmo tempo de sua verbalização, de sua realização e na sua representação
gráfica das unidades manipuladas.
O SENTIDO QUE VERGNAUD DÁ AO DESENVOLVIMENTO NÃO É O
MESMO DADO POR PIAGET.
A Teoria do
desenvolvimento em Piaget busca caracterizar os
|
estágios na criança. Piaget pesquisou muito esse assunto.
Na figura 1 a seguir, pode-se ver o que Vergnaud chama de ordem total da representação do desenvolvimento
piagetiano.
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Figura 1 - Representação gráfica dos estágios de
desenvolvimento de ordem total dado por Piaget.
Quando Vergnaud estuda as competências em conjunto,
encontra determinada ordem
parcial: há competências que são lineares e outras que
realmente se cruzam entre si. A figura 2 ilustra essa abordagem analítica do
desenvolvimento e abandona o sequênciamento rigoroso piagetiano.
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Figura
2
Vejamos então: [...] se o modelo dos estágios
totalmente ordenados, caracterizados pelas estruturas lógicas muito gerais, é
hoje superado,
|
esta não é uma razão para renunciar a descrever e analisar
a estrutura de ordem parcial das competências e das concepções das crianças,
e a marcar as filiações e as rupturas (VERGNAUD, 1987, p. 3).
A análise de competências das crianças e dos adultos, no
sentido dado por Vergnaud (2003a), pretende abarcar todos os registros da
atividade do sujeito, enquanto a lógica, tão importante para Piaget (1976), é
somente um dos domínios dessa atividade.
Por outro lado, se existem regularidades no
desenvolvimento, e estas existem em quantidade, declara Vergnaud (1987), é
necessário ter outros referenciais teóricos para investigá-las. É a esse
problema que a teoria dos campos conceituais pretende responder.
Para Vergnaud (1987), o que sabemos do desenvolvimento e da
aprendizagem de conhecimentos impele-nos a rejeitar o simplismo de
determinados estudos e modelos que usam a dicotomia inexperiente/experiente
(alunos fracos e alunos fortes). Essa dicotomia reduz a algumas etapas um
processo que compreende a formação de um grande número de competências e de
conceitos distintos e cuja construção ou apropriação se sucedem durante um
longo período de tempo.
·
O papel da didática e a
contribuição de Vergnaud ao conceito de desenvolvimento.
|
O papel atribuído às situações no desenvolvimento das
competências nos leva a compreender o espaço didático dessa teoria. Ao
explicar os objetivos de sua teoria, Vergnaud (1990) propõe que ela seja a
base para a explicação dos fenômenos de desenvolvimento e de aprendizagem.
Considerando que a teoria dos campos conceituais oferece um quadro para a
aprendizagem, ela interessa à didática; mas ela não é só uma teoria didática.
Sua principal finalidade é fornecer um quadro teórico que permite compreender
as filiações e as rupturas entre os conhecimentos, entre as crianças e os
adolescentes, aqui entendendo por conhecimento
tanto o saber-fazer como os saberes-expressos - possível de serem vistos
- (VERGNAUD, 1990).
Podemos, então, dizer que o conceito de situação não é
novo, uma vez que ele apareceu com as pesquisas em didática, graças às idéias
de Brouseau (1998), que lhe deu várias distinções para pensar as situações de
aprendizagem e de ensino. No sentido dado pelo psicólogo francês, tal
conceito tem sua essência explicitada no seio das três teorias que compõem a
teoria de campos conceituais. Já o processo psicológico de conceptualização
implica o aspecto da representação, pouco ou não consciente, como
determinante para a compreensão de como o sujeito constrói sempre, durante a
atividade, suas competências.
II - AS
CONTRIBUIÇÕES DE BRUNER SOBRE O DESENVOLVIMENTO COGNITIVO ALÉM PIAGET.
BRUNER dedicou seus estudos durante toda vida à investigação
psicológica e ao ensino. Uma preocupação permanente observada na
|
obra de BRUNER é com a condução do processo ensino-
aprendizagem, que sob sua ótica deve ser fundamentada em investigações,
preferencialmente, levada a cabo por uma equipe formada por psicólogos e
educadores. Defendeu na psicologia, a mente como objeto primordial de
pesquisa, considerando esse o objeto por excelência da psicologia.
Em 1940, já em Harvard estudou sobre a percepção como
contribuição de oposição ao behaviorismo, uma vez que atribuiu uma
subjetividade à percepção, o que não ocorria com a posição dos empiristas.
Um dos primeiros experimentos feitos por BRUNER foi sob a
influência do campo subjetivo quando realizou pesquisa com crianças de níveis
socioeconômicos diferentes ao avaliar o tamanho de figuras apresentadas com
moedas. As crianças de menor poder aquisitivo acharam-nas maiores que as
demais crianças.
Em 1950, esse psicólogo começa a se interessar pela
pesquisa cognitiva na formação de conceitos, juntamente com Miller, Newell e
Simon (MOREIRA, 1999), seus colegas de investigação nessa área de
conhecimento. Foi então ao encontro de Piaget que influenciou sua visão de
desenvolvimento psicológico como um processo
evolutivo de representação do mundo. A partir daí desenvolveu intenso
intercâmbio com pesquisadores envolvidos com os estudos na área da educação
para formular um novo currículo em ciências e matemática para o ensino
básico, coordenado pela Academia Nacional de Ciências em Massachusetts, EUA.
|
Na Inglaterra, BRUNER envolveu-se ativamente com a pesquisa
sobre desenvolvimento infantil, ressaltando o papel da linguagem nesse
processo, indo assim ao encontro de Vygotski, para estudá-lo intensamente
para apresentar ao público norte-americano a obra clássica Pensamento e Linguagem do psicólogo bielorusso.
Ao lado de Luria e Leotiev, psicólogos também russos,
BRUNER reafirmou sua crença na importância da dimensão cultural na formação
do psiquismo humano, particularmente, quando desenvolveu estudos sobre o self
(eu), a narrativa e a psicologia do senso comum.
A sua concepção de desenvolvimento, e como ele se processa
é influenciada por Vygotski, pois embora BRUNER tenha recebido influencia de
Piaget em seu pensamento, considerava a teoria piagetiana mais focada em
desvendar o desenvolvimento humano do que no funcionamento do psiquismo.
Nessa direção, a concepção de Vygotski de funcionamento psicológico como
moldado pela cultura atende melhor a concepção de desenvolvimento de BRUNER,
ou seja, no caso, a evolução na forma de representar a experiência, que ocorrem
em níveis progressivos de abstração.
A cultura, em conseqüência de sua importância no
processo de desenvolvimento, é, coerentemente, uma das dimensões mais
importantes na educação na obra de BRUNER. Já mesmo em suas primeiras
reflexões sobre o ensino e técnicas instrucionais, no caso de demonstração ou
instrução verbal, essas são analisadas em relação à sua cultura, por meio da
comparação com grupos como os caçadores-coletores (experiência de caça
primitiva) que usam
|
Saiba Mais
Jerome BRUNER nasceu em Nova York em 1915.
Formou-se em psicologia aos 22 anos de idade pela Duke University do estado de Carolina do Norte. Em Harvard, concluiu precocemente seus estudos de pós- graduação, onde
concluiu seu
doutorado em 1941.
Fundou
em 1945, como docente, em Harvard o Center for Cognitive Studies com George Miller. Trabalhou em Harvard até o ano
de 1970 quando foi convidado a
ensinar na
Universidade de Oxford
por um certo período. Em 1980, já estava de volta aos EUA para trabalhar na
New York University a fim de dirigir o Instituto de Humanidades dessa
universidade onde até hoje permanece. Tem 95 anos.
|

majoritariamente a demonstração para ensinar enquanto que a
sociedade contemporânea usa a instrução verbal.
![]()
Caçadores coletores de
cultura primitva
Nesse caso, as técnicas expositivas seriam mais
limitadas que a demonstração em termo de contextualização, obviamente, mais
cultural. Para BRUNER, o ensino deve estimular o pensamento do aluno na
escola, o que pode ser feito, em primeiro lugar, pela adaptação da forma de
apresentação do conteúdo ao nível de representação do aprendiz.
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Demonstração de uma atividade
O modo, porém, mais importante de estimular o
pensamento em sala de aula é como o professor atua, problematizando,
aproveitando situações em que questões possam ser colocadas, sem fornecer
respostas que levem os aprendizes à acomodação. Exemplo de uma situação:
|
![]() |
No automóvel de Nei tem lugar para 5 pessoas. O
lugar do motorista
|
SAIBA MAIS
O ensino de tópicos ou habilidades específicas,
descontextualizados de sua aplicação, ou inserção no campo mais amplo de
conhecimento dificulta a generalização (BRUNER)
|
|
é sempre ocupado por ele,
e os outros lugares ele usa para
|
||
transportar seus amigos.
Hoje, por exemplo, ele vai transportar 18
|
||
amigos de sua casa até o
estádio de futebol. Quantas viagens, no
|
||
mínimo, ele terá de fazer
para transportar os 18 amigos em seu
|
||
automóvel se ele não
ultrapassar a lotação máxima de seu carro?
|
||
(PCN em AÇÃO, primeiro e
segundo ciclos, 2001, p.113)
|
||
A proposta de BRUNER para
promover a problematização seria a
|
||
descoberta. Essa sua idéia
se forma a partir da critica feita ao modo
|
||
expositivo de ensino,
analisando o controle que o aprendiz tem da
|
||
trajetória de pensamento desenvolvido pelo professor quando
|
||
apresentam definições,
explicitando relações, argumentação e outras,
|
||
A importância da motivação
do aprendiz nessas duas situações de
|
||
aprendizagem é distinta e
diferente. Consideravelmente diferente
|
||
para BRUNER em importância
e intensidade.
|
||
Recentemente, BRUNER incluiu outros elementos à sua
|
||
argumentação a favor de um
ensino centrado na atividade do aluno,
|
||
admitindo que os debates
educacionais têm evitado questões
|
||
fundamentais como aquelas
que se voltam para refletir os problemas
|
||
gerados pela avaliação.
Nessa direção, sugere que o ensino deve
|
||
incentivar a cooperação,
além do sentido de reflexão e significados
|
||
da aprendizagem.
|
||
Assim, as disciplinas
ligadas às ciências sociais deveriam ensinar o
|
||
que chama de três grandes
Pés: o Presente, o Passado e o Possível.
|
||
O ensino das ciências
naturais, pelo seu tipo de explicação, causal e
|
||
verificável, tem sido mais
valorizado do que o de base interpretativa
|
das ciências naturais. Mas, a explicação
interpretativa pode não
|
||
apenas enriquecer a mente,
mas também ser uma ferramenta
|
||
preciosa de aprendizagem
sobre o mundo e sobre nós mesmos.
|
||
BRUNER toma o cuidado de
incentivar no processo de ensino e
|
||
aprendizagem a produção de
obras, cuja finalidade é exteriorizar o
|
||
conhecimento construído,
como as culturas o fazem por meio de suas
|
||
instituições, como a arte,
o que fortalece o sentido de identidade e
|
||
orgulho ao grupo.Vejamos
uma situação didática:
|
||
Observem bem a reprodução
da imagem do quadro de Guernica, do
|
||
pintor Pablo Picasso e
respondam:
|
||
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SAIBA MAIS
É preciso substituir a
concepção empirista da aprendizagem pela mente ativa, que constrói
significados (BRUNER, in: REGO, 2009, p.22).
|
|
As pessoas e os animais parecem estar em movimento? Como o
|
||
autor expressa
movimento?Uma das figuras humanas está numa
|
||
posição corporal bem
distinta das demais: pode-se localizá-la? (PCN
|
||
em AÇÃO, primeiro e
segundo ciclos, 2001, p.115).
|
||
Por fim, podemos dizer que
em toda a obra de BRUNER o aluno é
|
||
peça fundamental que pode se desenvolver cognitivamente com
a
|
||
atuação eficaz
da escola/cultura, cuja finalidade é torná-lo um ser
|
||
autônomo e ativamente
atuante em seu contexto de vida.
|
![]()
Atividades
1.
Estabeleça a diferença básica
entre a concepção de desenvolvimento cognitivo concebido por Piaget e a
formulada por Vergnaud.
Resposta: A teoria de desenvolvimento piagetiano, baseado
nas operações lógico-matemáticas, via os estágios numa sequência rígida de
estágio de ordem total, escalada. Vergnaud estudou as competências em
conjunto e descobriu que elas poderiam se desenvolver parcialmente ou
totalmente, afastando-se de uma sequência rigorosa, e, vendo os fenômenos de
forma analítica.
2.
Que traço distingue a perspectiva
de desenvolvimento cognitiva defendida por Bruner da concepção de
desenvolvimento piagetiano?
Resposta: o impacto da cultura na conduta do homem fez Bruner se
aproximar de Vygotski, valorizando a linguagem e a cultura como
|
faziam os psicólogos russos (Luria e Leontiev) e se afastar
de Piaget pesquisava o desenvolvimento cognitivo com base nas operações
lógico-matemáticas.
RESUMO
· Pensamento de
Vergnaud sobre o Desenvolvimento Cognitivo comparado com a formulação
piagetiana de desenvolvimento.
·
O impacto da cultura na concepção
psicológica de desenvolvimento de Bruner.
Referência
BROUSSEAU, G. Introdução ao estudo
das situações didáticas: conteúdo e método de ensino. São Paulo: Ática,
2008.
BRUNER, J. A cultura da
Educação. Trad. Porto Alegre: ARTMED, 2001.
DA ROCHA
FALCÃO, J.T. Psicologia da educação
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Extrato do texto, Imagens do conhecimento e ação docente no
Ensino Superior Nílson José Machado (USP - Faculdade de Educação), (pag. 13 a
20, 2008).
Conhecimento: imagens tácitas
1.
Imagens tácitas
Existem muitas imagens para representar o processo de
construção do conhecimento. Conhecer é como encher um balde de matéria, ou como
construir um cuidadoso encadeamento, de temas, ou como tecer uma teia de
significações, ou como fazer emergir como a ponta de um iceberg algo que já
existe dentro de nós, ou ... tudo isso junto? Como se manifestam tais imagens,
no dia-a dia, na sala de aula? Qual a importância de conhecê-las, de
explorálas? Existe uma imagem que seja a “correta” no sentido de descrever adequada
e completamente os processos cognitivos? Qual seria ela?
No que se segue, tais questões serão examinadas, buscando-se
respostas para as mesmas que possam instrumentar o trabalho do professor. O
fato é que cada uma de tais imagens está associada a ações docentes bastante
características. É significativamente distinta a ação de planejar quando é
inspirada pela idéia encadeamento lógico ou pela idéia de tecer uma rede. Ou a
ação de avaliar quando é orientada pela imagem do enchimento do balde, ou da
emergência do iceberg. Ocorre ainda que certas práticas, absolutamente
consentâneas com determinadas imagens, são francamente incompatíveis com
outras. Ao deixar-se orientar, portanto, por certa imagem, é importante para o
professor adequar suas práticas, de modo a não mergulhar em um mar de
incongruências. O grande complicador na busca de tal sintonia é o fato de que
tais imagens operam tacitamente, subrepticiamente. Pouco se fala delas, mas
elas subjazem e agem efetivamente, organizando as práticas, inspirando modos de
atuação. Buscar uma explicitação do modo como agem tais imagens é nosso
objetivo.
2.
O balde
Comecemos pela imagem do balde. Explicitamente, ao que tudo
indica, não existem mais professores que imaginam os alunos como se fossem
baldes vazios a serem preenchidos com a matéria que recebem na escola. Trata-se
de uma imagem tosca, completamente ofuscada pelos sofisticados construtivismos
de diferentes matizes. Mas disfarçadamente no discurso, e escancaradamente em
algumas práticas docentes, o “baldismo” subjaz. Ele está presente, por exemplo,
quando se fala em “nível do aluno”, ou em “nível do conhecimento”, ou em
“conhecimento acumulado”, ou em outras expressões menos diretas. Ele permanece
ativo quando se identifica um processo de avaliação como um processo de medida:
a nota seria como o indicador em uma vareta inserida no líquido/matéria contido
no recipiente/aluno. Ou nos planejamentos que se reduzem a contabilizar o
número de aulas dedicadas a cada assunto, como se se estivesse regulando a
vazão da torneira que enche o balde/aluno de matéria. É, o balde não existe,
mas está em toda parte.
3.
A cadeia
Consideremos agora a imagem do conhecimento como um
encadeamento, ou do conhecer como encadear. A cadeia está associada diretamente
ao pensamento cartesiano, tendo, em sua origem, o fundamental livro Discurso do
Método, de Descartes (1647). Para Descartes, o conhecimento somente poderia ser
construído a partir de “idéias claras e distintas”. Assim, diante de uma grande
dificuldade, em termos cognitivos, o caminho era um só: subdividir a tarefa,
decompô-la em partes suficientemente pequenas para serem apreendidas com
clareza, e então, enumerar tais fragmentos, reconstruindo o objeto por meio de
um encadeamento lógico linear. Tal encadeamento constituiria, portanto, a ordem
necessária para “bem conduzir a razão” (o título completo do livro de Descartes
é Discurso do Método para bem conduzir a razão e descobrir a verdade nas
ciências). Algumas das principais palavras de ordem que predominam na
organização do trabalho escolar nos diversos níveis de ensino até hoje são
tributárias das máximas cartesianas. “Pré-requisitos” e “seriação” são apenas
dois dos exemplos mais notáveis. Segundo tal perspectiva, além de pontos de
partida necessários, existem temas que precisam ser estudados necessariamente
antes de outros, não podendo ser quebrada a cadeia lógica da apresentação dos
diversos conteúdos. Existiriam assuntos que deveriam ser ensinados, digamos, na
sexta série; se não o forem, quebra-se o encadeamento e o aluno precisa ser
retido em sua progressão. Naturalmente, qualquer narrativa pressupõe um
encadeamento, mas as pressuposições cartesianas exacerbam tal necessidade. E
foram tão bem sucedidas no âmbito do conhecimento, que terminaram por ser
“exportadas” para o universo do trabalho, constituindo a idéia central que
subjaz à organização das linhas de montagem dos automóveis, por exemplo. Com
certo exagero mas sem fugir à verdade, seria possível afirmar-se que a forma de
organização de muitas escolas, ainda hoje, assemelha-se à estruturação das
linhas de montagem.
4.
A rede
Uma outra perspectiva é a propiciada pela imagem da rede
como representação do conhecimento. Segundo tal ponto de vista, o conhecimento
é como uma grande teia, uma grande rede de significações. Os nós são os
conceitos, as noções, as idéias, os significados; os fios que compõem os nós
são as relações que estabelecemos entre algo, ou um significado que se constrói
e o resto do mundo. Iniciar essa teia não constitui – nunca constituiu – um problema
escolar: todos os alunos já chegam à escola com uma proto-teia de
significações, engendrada pelo domínio da língua em sua forma oral. À escola
cabe ampliar, desenvolver mais acuradamente aqui e ali, enriquecer as relações
percebidas, nunca iniciar do zero a construção das significações. Nos processos
de ensino, para percorrer essa teia, temos que encadear significações, temos
que alinhavar percursos. Cada curso que se organiza constitui um percurso sobre
uma teia de significações. Mas não existem encadeamentos únicos, percursos
absolutamente necessários, sendo sempre possível arquitetar uma grande
diversidade de caminhos para articular dois nós/significações. Além disso, essa
imensa teia que serve de imagem para o conhecimento é absolutamente acentrada: o
conhecimento não tem centro, como não o tem a cultura, de uma maneira geral; o
que existem são centros de interesse. Assim, é possível planejar o tratamento
de determinado tema de muitas formas distintas, dependendo do feixe de relações
que são vivenciadas, que são percebidas em determinado contexto. E o
significado da avaliação também resulta bastante distinto, em relação às
pressuposições cartesianas de encadeamento.
5.
O iceberg
Uma quarta imagem para compor o cenário é a do conhecimento
como um iceberg. Nesse caso, a idéia norteadora é a de que nosso conhecimento
sobre qualquer tema é sempre apenas parcialmente explícito, ou passível de
explicitação, sendo, em sua maior parte, tácito, subjazendo como a parte
submersa de um iceberg. Cada um de nós sempre sabe muito mais, sobre qualquer
assunto, do que aquilo que consegue explicitar, expressar em palavras. Os
mecanismos da percepção são muito mais ricos e complexos do que imagina as
simplificadas teorias baseadas em associações do tipo estímulo/resposta. Também
como docentes, sempre ensinamos muito mais do que pretendemos explicitamente,
para o bem e para o mal, servindo tacitamente de exemplo ou de contra-sexemplo.
A parte submersa do conhecimento de que dispomos, que aprendemos ou que
ensinamos é, no entanto, absolutamente fundamental para a sustentação do que
conseguimos explicitar. A educação escolar formal seria sempre orientada pela
busca de uma ampliação na capacidade de explicitação. Um adulto não
escolarizado sabe muitas coisas, mas busca na escola o desenvolvimento de tal
capacidade. Como seres humanos, nosso conhecimento pessoal sempre estaria
representado por esses dois domínios fundamentais: o tácito e o explícito.
Articulá-los, arquitetando estratégias de emergência do tácito, seria a função
precípua do trabalho escolar. Mas sabemos que nunca será possível explicitar
tudo o que se conhece. Assim como em cada pessoa convivem e articulam-se as
dimensões consciente e inconsciente, também estamos “condenados” a um
permanente ir e vir entre o que se sabe tacitamente, o que se incorporou por
meio de vivências, hábitos ou estratégias culturais e o conhecimento de que
precisamos dar “provas” explícitas, nos processos de avaliação.
6.
Os cegos e o elefante
Representadas essas quatro imagens no cenário epistemológico
– balde, cadeia, rede, iceberg - qual seria a imagem mais correta, mais
adequada para caracterizar os processos cognitivos? Qual deveria ser a escolha
do professor para mais bem orientar sua prática como docente? A resposta é
muito simples: tais questões não fazem o menor sentido. Há uma história muito
conhecida, onde seis cegos que encontram um elefante tentam descrevê-lo, cada
um recorrendo a uma imagem particular. Um deles, passando as mãos no corpo do
elefante, imagina-o como uma grande parede; outro, abraçando uma de suas patas,
associa-o ao tronco de uma árvore; outro, alisando suas presas, compara-o a uma
espada; um outro, ainda, ao segurar o rabo do elefante, imagina-o como uma
corda... Cada um projeta uma perspectiva, a partir da percepção imediata pelos
sentidos. E a pergunta “qual dos seis tem razão?“ não tem, evidentemente, o
menor sentido. Qualquer um que jure ser um elefante exatamente como uma parede
estará delirando. Como estará também quem garantir que um elefante é um tronco
de árvore. Para construir uma imagem do elefante precisamos compor as diversas
perspectivas que emanam das percepções particulares de cada um dos cegos.
Diante das imagens do conhecimento, sentimos algo parecido. Cada imagem
propicia uma perspectiva, uma “visão” parcial do elefante/conhecimento. Se
nosso interesse é conhecer o conhecimento, ou conhecer como se conhece, tal
como os seis cegos, devemos compor imagens. Há um sentido em que conhecer é
acumular. Não começamos do zero, todos os dias. Mas a idéia de acumulação é
claramente insuficiente para caracterizar o conhecimento. Em certo sentido,
poderíamos inclusive afirmar que para conhecer, precisamos aprender a esquecer.
Quem guarda absolutamente tudo, termina por perder a capacidade de se ater ao
que é fundamental, por tornar-se incapaz de abstrair, de pensar, e por
conseguinte, de conhecer. Há um outro sentido em que conhecer é encadear. Sem
dúvida, qualquer narrativa pressupõe, como já foi dito, um encadeamento. Mas
existe uma liberdade imensa nessa organização linear, e a organização da escola
freqüentemente explora muito pouco essa possibilidade de múltiplos percursos na
exploração da teia de significações. Há, naturalmente, o fato de que conhecer é
como tecer, enredar, articular por meio de relações temas aparentemente
desconectados. E há a dimensão tácita do conhecimento, que é imprescindível
para a caracterização do mesmo, uma vez que nada parece mais visível de que o
fato de conhecermos muito mais do que conseguimos expressar. O próprio fato de
que imagens do conhecimento como as quatro anteriormente referidas orientam as
ações docentes, influenciam a organização da escola, ainda que pouco falemos
delas, ainda que elas operem tacitamente, é altamente revelador da relevância
da dimensão tácita do conhecimento. Pois é, diante do conhecimento, somos como
os seis cegos.
FÓRUM AVALIATIVO – AULA 02. REFERENTE A SEMANA 02. Enviar esse arquivo.
Resolver
a Questão a seguir:
No texto das aulas 01 e 02 de
MEB, são estudadas algumas concepções em matemática que são representadas por
figuras segundo os teóricos Nilson Machado, Piaget e Vergnaud. Observe abaixo quatro
figuras que revelam concepções sobre o conhecimento e como este se
desenvolve.
Figura 1
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Figura 4
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Figura 2
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Figura 3
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(A) Figura 1
(segmento de reta com quatro
pontos)
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(1) Representa a concepção que considera
o aluno disfarçadamente no discurso, e
escancaradamente em algumas práticas docentes, o “baldismo” subjaz. Esta
concepção está presente, por exemplo, quando se fala em “nível do aluno”, ou
em “nível do conhecimento”, ou em “conhecimento acumulado”, ou em outras
expressões menos diretas. O “baldismo” permanece ativo quando se identifica
um processo de avaliação como um processo de medida: a nota seria como o
indicador em uma vareta inserida no líquido/matéria contido no
recipiente/aluno.
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(B) Figura 2
(cabeça vazia)
|
(2) Quando Vergnaud estuda as
competências em conjunto, encontra determinada ordem parcial: há competências que são lineares e outras que
realmente se cruzam entre si. A figura ilustra essa abordagem analítica do
desenvolvimento e abandona o seqüenciamento rigoroso piagetiano.
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(C) Figura 3
(teia de aranha)
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(3) Nosso conhecimento sobre qualquer tema é sempre apenas parcialmente explícito, ou passível de
explicitação, sendo, em sua maior parte, tácito, subjacente. Cada um de nós
sempre sabe muito mais, sobre qualquer assunto, do que aquilo que consegue
explicitar, expressar em palavras.
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(D) Figura 4
(iceberg)
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(4) O
conhecimento é considerado como uma seqüência lógica que Vergnaud chama
de ordem total da representação do
desenvolvimento piagetiano.
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A leitura correta
de cima para baixo da associação entre as duas colunas é:
a. ( ) A4;
B2; C1; D3;
b. ( ) A4; B3; C2; D1;
c.
( ) A1;
B2; C3; D4;
d. ( ) A1;
B3; C2; D4;
e. ( X ) A4; B1; C2; D3;
O prazo para envio desta questão resolvida é até 23h59min do dia 06.03.18.
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